No afã de encontrar uma salvação política, governo flerta com descontrole inflacionário
O desembarque de Alexandre Tombini do Banco Central pode estar a caminho ou não passar de mera ameaça, mas, de concreto, o governo Dilma Rousseff já dificultou a tarefa de controlar a inflação neste ano.
Os últimos dias mostraram -ou deram a entender, o que, para os mercados, é quase a mesma coisa- que, no afã de encontrar uma salvação política, o Palácio do Planalto deixou em segundo plano a racionalidade econômica.
Tombini está longe de ser um ortodoxo, ou mesmo um tecnocrata especialmente zeloso com seus resultados e procedimentos. Em sua gestão, a inflação sempre ficou acima da meta; no ano passado, superou a casa dos 10%, mesmo com o país em profunda recessão.
Além disso, o BC passou por um retrocesso institucional. Sua autonomia tornou-se duvidosa, e sua comunicação, errática. Várias de suas decisões pareceram mais pautadas por interesses políticos da presidente do que pelos objetivos da política monetária.
Ainda assim, Tombini é, de longe, o economista de mais credibilidade a restar no primeiro escalão do Executivo. Os rumores de sua saída indicam que a política econômica corre o risco de abraçar medidas para além de limites já elásticos de tolerância.
Com a chegada do ex-presidente Luiz Inácio Lula Silva ao ministério, o PT sonha em elevar gastos públicos, reduzir juros, estimular o crédito, usar dólares das reservas em investimentos.
Tudo, claro, pode não passar de espuma. Não será surpresa se Lula, mais uma vez, fizer o contrário do que diz: o governo poderá dar até novas demonstrações de compromisso com a austeridade.
O estrago, porém, já está em estágio adiantado. O frágil compromisso do BC em manter a inflação não muito distante do teto de 6,5% neste ano, uma das poucas coisas que se sabia da política econômica, agora é motivo de dúvida. A alta do dólar reflete e amplia as incertezas.
Sem nenhum sinal claro do governo, empresários e investidores se protegem como podem: remarcam preços, compram dólar e cobram juros altos.
O que impede a inflação de disparar, na prática, é a retração da produção e do consumo. Flertar com a ideia de estimular artificialmente algum espasmo de crescimento econômico equivale a flertar com o descontrole inflacionário.
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